Waris Dirie, uma somaliana e ex-modelo internacionalmente famosa, foi vítima da circuncisão feminina aos cinco anos de idade. Por não querer largar a escola, aos 13 anos, fugiu da localidade de Galkayo para a capital Mogadíscio. Com a ajuda da avó, que vivia naquela cidade, após foi para Londres trabalhar na embaixada da Somália, onde ficou escondida até os 18 anos. Lá, passou a enxergar a mutilação como um crime.
Nessa época, um fotógrafo descobriu sua beleza e, em pouco tempo, Waris ganhou projeção mundial. Em vez de lamentar o que havia sofrido, decidiu expor sua experiência com a esperança de que a realidade fosse transformada. A respeito, foi lançado o filme Flor do Deserto, dirigido por Sherry Hormann e muito divulgado em diversos países africanos, exceto na Somália, nação majoritariamente muçulmana e um dos lugares mais difíceis de abordar o tema. Para Waris, “a melhor forma de combater é com educação, pois é uma questão cultural. Além disso, você precisa de leis rigorosas, caso contrário, isso não vai parar. Infelizmente, os governos não estão fazendo o suficiente para proteger as meninas”.
A prática
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a mutilação genital afeta cerca de 140 milhões de mulheres e meninas em todo o mundo. Além do sofrimento a que as vítimas estão sujeitas, a circuncisão aumenta os riscos de as mulheres contraírem infecções e HIV. O processo consiste no corte de parte ou de toda a genitália externa da mulher e tem o objetivo de eliminar o prazer durante o sexo, causando danos físicos e psicológicos. Outra versão, chamada infibulação, é a costura dos lábios vaginais ou do clitóris. Tudo feito sem anestesia e com instrumentos inapropriados. “Nós recebemos muitos relatos de que as meninas fogem de suas casas ou escolas para escapar desse crime brutal. Podemos ver uma mudança, especialmente entre as mulheres jovens, mas ainda muito tímida, com relação à atitude da geração mais velha. Essas são completamente ignorantes e querem continuar com essa loucura, em que os governos não fazem o suficiente para extirpar essa prática”, destaca Waris. Em países como Somália, Guiné, Djibuti e Egito, cerca de 90% das mulheres entre 15 e 49 anos são mutiladas. Por outro lado, a prática tem diminuído em Benin, Libéria, Nigéria, Quênia, República Centro-Africana e na Tanzânia.
Em 2013, a Assembleia Geral da ONU aprovou, por unanimidade, uma resolução que proíbe a prática da mutilação genital feminina. Este ato significativo foi assinado pelos 194 Estados-membros. A resolução estimula a condenação das práticas nocivas às mulheres e às meninas na aplicação da legislação, além de angariar recursos para proteção das vítimas.
No dia 6 de fevereiro foi assinalado o Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina. “Quando eu comecei a fazer campanha, ninguém sabia sobre a prática. Hoje, muitas pessoas sabem sobre essa tortura cruel”, comenta Waris. Segundo dados da ONU, desde 2008, cerca de 10 mil comunidades em 15 países pararam com a mutilação feminina. Além disso, aproximadamente 1.775 comunidades em toda a África pretendem acabar com a prática. “Estou muito feliz por ver, a cada dia, mais meninas e meninos se opondo a esse crime, por ver mais jovens engajados nessa causa. Eles estão conscientes da necessidade de fazer com que as leis não fiquem restritas a um pedaço de papel”, finaliza.
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