Cultura

Audrey Hepburn é um ícone de ser humano, beleza e elegância que atravessa gerações. Ainda hoje, a atriz é lembrada por sua presença marcante nas telas dos cinemas, no papel de personagens célebres, como em “Bonequinha de Luxo”, filme que, neste ano, completa 50 anos de lançamento.

Modelo preferida de Givenchy, a sofisticação virou marca registrada de uma estrela maior, cujos atos humanitários foram um legado. Por trás do glamour que transmitia, encontrava-se uma mulher sensível, altruísta e preocupada com a fome e a miséria de regiões tão distantes do meio hollywoodiano.

Após dois divórcios – o primeiro com Mel Ferrer e o outro com o psiquiatra italiano Andrea Dotti –, duas gestações, um novo casamento com o ator Robert Wolders e mais de 30 filmes lançados, Audrey assumiu o papel mais importante de sua vida: o de embaixadora da Boa Vontade do Unicef, em 1987.

Trajetória altruísta

Longas viagens patrocinadas pela organização humanitária a fez se deparar com a realidade triste de países paupérrimos, alguns castigados, há anos, por guerras civis – fato que aproximava do universo pessoal de Audrey. “Eu posso testemunhar o que o Unicef representa para as crianças, porque eu fui uma delas que recebeu comida e atendimento médico logo depois da Segunda Guerra Mundial”, disse em um dos encontros que participou em nome da organização, em 1989. E complementou, à época: “Eu tenho uma duradoura gratidão e confiança no trabalho que o Unicef realiza.”.

Os últimos anos de vida a atriz passou em missões pelo Unicef, dando palestras e promovendo concertos em prol de alguma causa nobre. Sua luta sempre esteve focada, principalmente, nos direitos das crianças, especialmente as da Etiópia e da Somália, países que visitou por diversas vezes.

Audrey também participou ativamente de campanhas de vacinação contra poliomielite na Turquia, de ações junto a mulheres carentes na Venezuela, de projetos sociais que envolviam crianças que moram e trabalham nas ruas do Equador, além de programas que investiam no fornecimento de água potável na Guatemala e em Honduras. Visitou ainda escolas em Bangladesh e alojamentos no Sudão, além de ter participado de ações que envolviam crianças pobres na Tailândia e no Vietnã. “Pessoas, muito mais que coisas, devem ser restauradas, revividas, resgatadas e redimidas: jamais jogue alguém fora”, disse Audrey Hepburn, numa dessas ocasiões.

As viagens ao exterior ocuparam grande parte de sua rotina fora das telas de cinema. Como se não bastasse, ela se dedicou a divulgar os trabalhos que realizava junto ao Unicef, como seu testemunho a deputados e senadores no Congresso norte-americano, campanhas para angariar fundos, palestras e mais de 15 entrevistas por dia para promover os trabalhos da organização, ao redor do mundo. Em uma delas, teria dito: “Eu nasci com uma enorme necessidade por afeição, e uma terrível necessidade de dá-la”.

Por esse trabalho, Hepburn recebeu, em dezembro de 1992, a mais importante condecoração concedida pelo governo dos Estados Unidos a um civil, a “Medalha Presidencial de Liberdade”. Um ano após esse feito, Hepburn morria aos 63 anos de idade, vítima de um câncer de apêndice. Anos mais tarde, receberia o “Premio Humanitário Jean Hersholt”, a título póstumo.

Em junho de 2003, o rosto da atriz estampou um selo comemorativo, lançado pelo “United States Postal Service” (USPS), como reconhecimento à vida e à obra da atriz em Hollywood e como embaixadora do Unicef.

Vida em Hollywood

Nascida como Audrey Kathleen Ruston, a filha única de um banqueiro britânico-irlandês com a baronesa holandesa, Ella van Heemstra, foi dispensada do balé por ser alta demais e não ter talento suficiente para a dança. A fim de garantir o sustento da família na Inglaterra, Audrey tornou-se corista e modelo fotográfico, com algumas (e não tão consideráveis) participações no meio artístico. Entretanto, o ingresso efetivo na Sétima Arte deu-se em seu primeiro trabalho nas telas, no documentário “Dutch in Seven Lessons” (Alemão em Sete Lições).

Mas foi em 1952, que sua carreira começou a deslanchar, enquanto gravava o filme “Montecarlo Baby”, na França. Por uma sorte do acaso, Audrey foi vista no saguão do hotel, onde estava hospedada com o restante do elenco, pela escritora Collette. A autora trabalhava com a montagem da peça “Gigi” para a Broadway, cujo papel-título ainda não tinha intérprete, até aquele momento. As críticas não foram tão favoráveis ao trabalho de Audrey em “Gigi”. A plateia, por sua vez, havia detectado o encanto que aquela mulher, magra, com pele aveludada e de olhar sedutor transmitia ao subir aos palcos. E o público estava certo. Audrey ganhava, cada vez mais, a atenção de teatrólogos e, a partir de então, de diretores e cineastas.

Hollywood foi conhecer os seus atributos e a sua beleza descomunal somente no filme “A Princesa e o Plebeu”. Na audição para o papel de Princesa Ann, o diretor William Wyler se rendeu à interpretação sutil e brejeira de Audrey, escalando-a imediatamente para viver a personagem. Seu companheiro de cena era nada menos que Gregory Peck, ator já consagrado, que, no primeiro minuto, se rendeu à beleza e ao desprendimento da atriz em cena. A película foi tão bem recebida pelo público e pela crítica que Audrey foi indicada ao “Oscar” de melhor atriz, em 1953, levando a estatueta para casa.

Esse era apenas o início de sua trajetória de sucesso nas telas e fora delas. Três dias após levar o prêmio, Audrey recebeu o “Tony Awards” – prêmio máximo do teatro norte-americano – por sua atuação na peça intitulada “Ondine”. A segunda indicação para o “Oscar” viria com o filme “Sabrina”, que conta a história da filha de um chofer que se apaixona pelo filho do patrão, e a terceira com o drama “Uma Cruz a Beira do Abismo”, que acabou com qualquer dúvida que ainda restava sobre o seu talento. Nesse período intenso de filmagens, Audrey conheceu o marido Mel Ferrer, com quem teve o filho Sean, em 1960, após uma série de abortos espontâneos que a deixaram em uma depressão profunda. Sua volta aos cinemas, no entanto, foi triunfal no papel da interiorana Holly Golightly, que se muda para Manhattan (Nova Iorque) para tentar casar com um milionário que a sustentasse financeiramente, na trama “Bonequinha de Luxo”.

O filme era muito ousado para a época de seu lançamento, pois contava a história de uma mulher solteira, que vivia sozinha, frequentava festas, era independente e praticava sexo casual. O papel era um desafio para Audrey como atriz e para os estúdios de Hollywood, mais precisamente para a “Paramount”, que escalava uma bela e respeitável mulher para viver uma jovem audaciosa, que poderia ser tachada como uma menina má. Audrey chegou a recusar o papel quando leu a sinopse, mas foi convencida pelos produtores, juntamente com o seu marido Mel Ferrer, de que poderia realizar o filme sem manchar a imagem de boa moça que havia conquistado junto ao público.

A interpretação em “Bonequinha de Luxo” representou uma mudança nos modelos de Hollywood e no papel feminino no cinema, deixando de lado o moralismo social norte-americano dos anos 50 ao dar novos rumos para a mulher moderna. Além de revolucionar, o filme se tornou um clássico graças à interpretação de Andrey e ao figurino fielmente arquitetado por um dos profissionais mais respeitados da época, Hubert de Givenchy.

O “pretinho básico” e os óculos pretos que a atriz usou em uma das cenas épicas do filme – quando ela observa a vitrine da joalheria “Tiffany´s”, em Manhattan, logo na primeira sequência – são ícones de moda. Sua última aparição no cinema foi no ano de 2000, em “Além da Eternidade”, um drama onde vivia um anjo, com todo o esplendor e a serenidade que perpetuaram sua carreira e sua vida pessoal e, quando, de sua morte, Elisabeth Taylor disse no enterro: “Um anjo subiu ao céu!”.